Junho
No momento da concepção, a essência e o corpo físico se unem. Toda criatura viva é concebida dessa maneira, o que significa que todos têm certa combinação de uma essência e um corpo físico. As essências diferem muito entre espécies e serão discutidas no trabalho de setembro. Os corpos físicos também diferem entre espécies, mas sua utilidade geral é a mesma: eles tornam possível a locomoção, o acesso a nutrição, evitar perigo e procriar. Dos nossos três corpos, o corpo físico é aquele que temos mais em comum com o resto do mundo animal. Por essa razão, os trabalhos de Maio e Junho, dedicados ao cultivo do corpo físico, são representados pela colheita do feno – o feno que é comida para o gado.
Maio abrangeu a função motora do corpo físico; Junho irá se estender sobre a função instintiva. Enquanto as habilidades da função motora obviamente diferem entre espécies – um anda, outro voa, um terceiro se adapta a nadar – a função instintiva de todas as espécies é fundamentalmente a mesma. Ela é responsável pela sobrevivência e bem-estar do organismo. Ela governa todos os seus processos fisiológicos, como respiração, digestão, circulação etc. Também é programada a favorecer condições ou recursos que colaboram a sua sobrevivência e evitam aqueles que se constituem uma ameaça. Essa função formula suas prioridades de acordo com isso, mesmo se essas prioridades entrem em conflito com as necessidades da essência e personalidade. Esse é um trabalho correto a partir da perspectiva da função instintiva, pois sem tais prioridades nós não iríamos ter os requisitos básicos para viver. Não teríamos o instinto de evitar perigo, não teríamos o ímpeto de ganhar o pão de cada dia, nem teríamos o senso de responsabilidade de prover para nossos filhos. Nossa espécie enfrentaria a extinção.
As prioridades da função instintiva não engloba o cultivo interior. Desde que façamos apenas breves e intermitentes esforços para estudar a estrutura de nossa psicologia e observar seu funcionamento em tempo real, ela apenas resiste moderadamente nosso anêmico progresso. Mas uma vez que avançamos em nossos esforços e tentamos introduzir alguma forma de disciplina interior, algum governo alternativo a nosso habitual forma de manifestar, a função instintiva sente que suas prioridades estão sendo ameaçadas e aumenta sua resistência. O modo específico de como isso ocorre varia e é material para auto-observação, mas a regra geral é que ela amplifica nossas demandas corpóreas. Como o cérebro no comando de monitorar nossos processos corporais, ele pode manipulá-lo a dissuadir esforços. Pode nos fazer sentirmos muito cansados, indispostos ou tontos, para investir mais atenção em nossa atividade atual do que o estritamente necessário para seu cumprimento básico e funcional. Sobre isso, pode ser dito que a função instintiva está sob a lei da gravidade. Como um rio que encontra o caminho mais fácil para o mar, ela sempre persegue o caminho de menor resistência e maior conservação de energia. O rendimento natural do nosso organismo é suficiente, o refinamento é supérfluo. A natureza é suficiente, o cultivo interior é supérfluo.
Nós podemos verificar a competição de nossa função instintiva contra o cultivo interior quando tentamos aplicar as disciplinas desse trabalho enquanto realizamos atividades instintivas. A função instintiva percebe isso como uma intrusão e irá resistir categoricamente. Uma boa área para experimentar é durante as refeições. Para observar a nós mesmo enquanto comemos, meramente desejar que isso aconteça não é suficiente; nós devemos empregar exercícios específicos para neutralizar a resistência instintiva. Geralmente isso envolve diminuir nossa velocidade natural enquanto nos alimentamos. Podemos fazer isso colocando nossos talheres na mesa entre as garfadas, ou impedindo que nossos cotovelos toquem a mesa ou tentando terminar de mastigar totalmente antes de preparar a próxima – ou tudo isso junto. Uma vez que nossa pressa habitual em torno da refeição é restringida, nós ganhamos a possibilidade de provar nossa comida – de trazer atenção ao sentido do paladar – ao invés de engolir e devorar como o resto do mundo animal.
Ao aplicar esses exercícios nas refeições, é importante notar que não estamos fazendo nada que prejudica o nosso corpo físico – não estamos negando o sustento que precisa para seu correto funcionamento. Estamos apenas insistindo que ele participe do que precisa em termos diferentes. A ameaça aqui não é existencial; é o usurpo de um tirano sentado no trono do nosso mundo interior – um tirano cuja existência não havíamos nem suspeitado. Verificar isso vale a pena por si só, mesmo se nos deparamos incapazes de introduzir auto-observação enquanto comemos, o que, pelo menos inicialmente, será o caso. Nós teremos dado um passo radical no sentido de revelar e compreender a psicologia da nossa função instintiva. Substituir isso por um governo consciente virá no seu devido tempo.
Esse é o nosso trabalho de junho.
Maio
Julho
A função do pensamento